Entidades assistenciais de Sete Lagoas continuam sem poder doar amostras grátis de medicamentos

Excesso de burocracia e legalismo impede doação de amostras grátis de medicamentos, que seguem apreendidos e perdendo a validade

 

  No último dia 21 de maio foi publicada no Diário Oficial do Município a Lei nº 8791/18, que regulamenta a distribuição gratuita de medicamentos por entidades assistenciais sem fins lucrativos em Sete Lagoas. A lei é baseada no Anteprojeto de Lei n° 235/2018 da Câmara Municipal, porém, o Executivo Municipal vetou uma emenda que tratava da doação de amostras grátis, o que na prática inviabiliza o funcionamento de instituições como a Farmácia do Bem (membro do Santa Helena Valley), a Associação das Voluntárias do Hospital Municipal (Avhom) e a Associação das Voluntárias Senhora das Graças (Avosg), que estão há mais de 80 dias fechadas, uma vez que mais de 80% de seus estoques são de amostras grátis doadas por médicos e dentistas da região.

 

  Como houve o veto, o projeto voltou para a apreciação dos vereadores na reunião ordinária da última terça-feira (29). À pedido dos vereadores Milton Martins, Ismael Soares e Gislene Inocêncio, o projeto foi retirado de pauta e uma comissão de análise ao veto foi criada. “A votação ficou para a próxima semana. Vamos tentar articular, pois até hoje tínhamos apenas seis votos contra o veto. Vamos tentar mais três votos de vereadores. Semana que vem voltaremos com mais força para derrubar esse veto”, espera Milton Martins, que preside a comissão.

 

  “Vamos nos reunir segunda-feira para discutir com o jurídico de todo mundo. A votação do projeto deve ficar para o dia 14 de junho. Estamos tranquilos porque a Comissão de Legislação e Justiça da Câmara deu parecer favorável de que não há ilegalidade nas doações”, afirma o vereador Ismael Soares, vice-presidente da comissão.

 

Alegação

  A Prefeitura, por meio do procurador geral do Município, Lucas Gonçalves de Brito, alega que o veto se justifica por ser “inconstitucional e ilegal” doar amostras grátis medicamentos. “Se há uma legislação federal que proíbe a distribuição de amostras grátis por entidades assistenciais, nós, enquanto município, subordinados que somos a uma legislação que abrange todo o território nacional, não podemos nos posicionar de forma contrária”, explica o procurador.

 

  O procurador alega ainda que a distribuição gratuita de amostras grátis de medicamentos que não seja realizada pelos médicos prescritores diretamente aos seus pacientes é vedada pela Resolução de Diretoria Colegiada – RDC n° 60, de 26 de novembro de 2009 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), autarquia sob o regime especial vinculada ao Ministério da Saúde a qual compete o controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à Vigilância Sanitária e possui competência para edição de normas a respeito do tema.

 

Outro lado

  Enquanto o excesso de legalismo e burocracia impede o funcionamento das entidades assistenciais, milhares de pessoas estão sem poder tratar de suas doenças, uma vez que muitos medicamentos custam caro, e os remédios vão perdendo a validade, apreendidos. “As entidades terão um custo ainda maior, pois trata-se de lixo hospitalar que não pode ser descartado no lixo comum. As empresas que coletam medicamentos cobram caro para recolher e incinerar tudo”, conta Marcelo Abreu, da Farmácia do Bem. Ele argumenta ainda que nada menos do que 148 cidades em todo o Brasil possuem leis municipais autorizando a doação de amostras grátis. “Será que os procuradores desses municípios são todos irresponsáveis?”, questiona Marcelo Abreu. Ele cita como exemplos os municípios de Campinas, Jundiaí e Itajaí, que possuem leis específicas regulamentando a doação de amostras grátis.

 

  Abreu defende ainda que não há na Constituição Federal nenhum inciso ou emenda que proíba a doação de amostras grátis. “Se não há na Constituição uma Lei Federal determinando a proibição, então não é inconstitucional”, explica. Ele ainda defende que não há uma justificativa dada pela Anvisa para existir a resolução 60 e que também não existe um lei federal que regulamenta a resolução.

 

  “E já que é para usar a Constituição Federal, ela diz que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana, e em seu artigo 3º diz que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária: III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;. Já em seu capítulo II, Dos Direitos Sociais, artigo 6º, temos que são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados. E mais: Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, um dos documentos básicos das Nações Unidas, diz no artigo III que todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”, argumenta Marcelo Abreu.

 

  A reportagem tentou contato com a Avhom, mas não obteve retorno, e com a Avosg, que preferiu não se pronunciar. Também enviou perguntas para a assessoria de imprensa da Prefeitura, mas não obteve resposta.

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